terça-feira, 17 de maio de 2016

As figurações típicas do homicídio no ordenamento positivo nacional e o estudo sistemático de seu tratamento penal (CP, artigo 121)

O direito existe por causa do homem.

O centro do universo jurídico é o ser humano (visão antropocêntrica do Direito).

O objeto mais relevante da tutela penal deve ser a vida.

Homicídio  é a morte de vida humana extra-uterina praticada por outrem.
  • Morte Clínica - Paralisação da função cardiorrespiratória 
  • Morte Biológica - Destruição molecular 
  • Morte Cerebral - Paralisação das funções cerebrais

Lei 9.434/97 Art. 3º. “A retirada post mortem de tecidos, órgãos e partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedido de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.

Homicídio Simples 

Art. 121. Matar alguém: Pena – reclusão de 6 (seis) a 20 (vinte) anos

Crime material - Produz resultado material

  • Exame necroscópico - (autópsia) 
  • Exame de corpo de delito direto;
  • Exame de corpo de delito indireto (desaparecimento de vestígios). 
  • Objeto Jurídico (bem protegido) : a vida humana
  • Objeto material (onde recai a conduta) : a pessoa
Sujeito ativo: qualquer pessoa (crime comum) 
  • Autoria mediata 
  • Autoria colateral
  • Autoria incerta 
Sujeito passivo : qualquer pessoa (alguém)
  • Vida extra-uterina (parto)
  • Prova da existência de vida (docimasia, circulação)
  • Descabe análise da viabilidade do recém-nascido 
TACRSP : “(...) a morte do feto durante o parto configura crime de homicídio, a menos que seja praticado pela própria mãe, sob influência do estado puerperal, caso em que o crime a identificar-se será infanticídio. Desde o início do parto (que se dá com o rompimento do saco amniótico) a morte do feto constituirá homicídio” (RT 729/571)

Tipo Subjetivo:
  • Dolo genérico – não exige qualquer finalidade especial, bastando a vontade de matar (animus necandi)
  • Dolo direto - o agente quer realizar a conduta;
  • Dolo eventual - assume-se o risco da produção do resultado;  
  • Dolo indeterminado - não se importa em produzir um ou outro resultado (ferir ou matar);
  • Dolo geral - (aberratio causae). 
"Quem, a curta distância, desfere tiro na cabeça do ofendido, ocasionando-lhe lesões de especial gravidade, revela, de maneira nítida, a intenção de matar" (TJSP- RT, 433/379).

"Assume o risco de matar e responde por crime doloso aquele que desfecha tiros de revólver sobre um grupo de homens, vindo a atingir o seu companheiro, em região perigosa e com êxito letal" (TJMT - RT, 401/436).

"Qualquer pessoa, por mais rústica que seja, tem a noção elementar de que, desferindo foiçadas em outrem, produzindo-lhe ferimentos gravíssimos, assume o risco de causar-lhe a morte. Essa previsibilidade é elementar" (RT, 376/204).

TJSP : “(...) torna-se difícil admitir que alguém possa ser responsável pela morte de outrem, que se suicidou, por haver sido a sua esposa por aquele difamada” (RT 497/321)

TJSP : “Homicídio – Dolo eventual – Desclassificação para a modalidade culposa – Réu não quis o resultado morte e também não assumiu o risco de produzi-lo – Culpa consciente, também chamada de culpa com previsão, esperando o agente que o evento não ocorra (...)” (JTJ 220/315)

“É doloso e não simplesmente culposo o procedimento de quem conduz a vítima à parte mais profunda de um açude, abandonando-a ali e provocando sua morte, por não saber nadar” (RT 443/432)

Consumação e tentativa: 

Intercriminis: cogitação; preparação; execução e consumação. 

Consuma-se com a morte da vítima.
  • Tentativa imperfeita: O processo executivo é interrompido. 
  • Tentativa perfeita ou acabada: O processo de execução é esgotado. 
  • Tentativa branca ou incruenta: Não resulta ferimento na vítima. 
“Disparando várias vezes o revólver contra a vítima, só não a atingindo devido a erro de pontaria, comete o acusado, em tese, homicídio tentado” (RT 571/326) 
  • Desistência voluntária
  • Arrependimento eficaz (art. 15 CP).
TJSP: “Tendo a possibilidade de persistir na agressão, mas dela desistindo voluntariamente, não age o acusado com animus necandi, que é requisito essencial da tentativa de homicídio” (RT 566/304)

“(...) Acusado que apenas desferiu um tiro na vítima, embora estivesse seu revólver plenamente municiado. Desistência voluntária. Desclassificação para o delito de lesões corporais” (RT 527/335)

Distinções:

• Matar – art. 121
• Lesionar – art. 129 § 3º 
• Estuprar – art. 213 c/c art. 223, PU 
• Roubar – art. 157, § 3º 
• Incendiar/Explodir – art. 251 c/c art. 258
• Cometer crime ambiental – Lei 9605/98 – art. 58, III 

Homicídio privilegiado: 

§ 1º - Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
  • Valor social 
  • Valor moral 
  • Emoção e não paixão
  • Estado de ânimo caracterizado pelo calor do momento
 TACRSP: “O valor social ou moral do motivo do crime é de ser apreciado não segundo a opinião ou ponto de vista do agente, mas com critérios objetivos, segundo a consciência ética-social geral ou senso comum” (RT 417/101)

“Por motivo de relevante valor moral, o projeto entende significar o motivo que, em si mesmo, é aprovado pela moral prática, como, por exemplo, a compaixão ante o irremediável sofrimento da vítima (caso de homicídio eutanásico)” (RJTJESP 41/346)

EMOÇÃO 
  • Transitória perturbação
  • Ocorre e passa 
  • Ira momentânea 
  • Abrupta e fugaz 
  • Flagrante de adultério
PAIXÃO  
  • Emoção em estado crônico
  • Permanece, incubando-se
  • Ódio recalcado 
  • Lenta e duradoura
  • Ciúme doentio
TJMG: “(...) questão passional, tão só, não pode ser alegada para a redução da pena” (RT 775/656)

"O homicídio privilegiado a que alude o art. 121, § 1º, do CP de 1940 é o determinado pelo impetus, pelo impulso psicofísico relativo que surge no auge da emoção. Mas, não é apenas esta, em si, que faz merecer o privilegium, porém a emoção derivada da injusta provocação da vítima" (TJSP - RT, 608/324).
O fato da vítima ter atropelado e matado o filho do réu não caracteriza a hipótese do homicídio privilegiado se agiu de modo refletido e, deliberadamente, armou-se de revólver ao procurar o desafeto, sabendo previamente onde e quando encontrá-lo” (RT 776/562)

"Ofender a honra da mãe do agente constitui, sem dúvida, provocação injusta. É motivo que causa emoção violenta, a ensejar imediata reação" (TJSP - RT, 568/270).

"Evidente que não se pode vislumbrar no gesto da vítima que desfaz ou procura desfazer o namoro ou mesmo noivado com o acusado, injusta provocação capaz de privilegiar o homicídio" (TJSP - RT, 508/334).

Apesar de o texto legal dispor da faculdade de redução da pena pelo juiz esta redução é obrigatória por se tratar de direito subjetivo do acusado. 

As formas de privilégio são pessoais não se comunicando aos co-autores que tenham agido por outro motivo.

Homicídio Qualificado

 § 2° Se o homicídio é cometido:

 (...) Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

• Maior periculosidade do agente 
• Causa especial de majoração da pena 

Crime Hediondo  

I - (...) ou por outro motivo torpe; Vil, repugnante, amoral (inveja, rivalidade, usura)
  • Ciúme não é considerado motivo torpe 
  • Vingança – depende do que a originou
STJ: “(......) a vingança, por si só, sem outras circunstâncias, não caracteriza o motivo torpe” (RSTJ 142/467)

II - por motivo fútil; 

• matar por motivo de pequena importância
• ausência de prova do motivo não é motivo fútil 
• ciúme não é considerado motivo fútil 
• vingança – depende do que a originou 
• não se admite motivação torpe e fútil 

"O motivo é fútil quando notadamente desproporcionado ou inadequado, do ponto de vista do homo medius e em relação do crime de que se trata. Se o motivo torpe revela um grau particular de perversidade, o motivo fútil traduz o egoísmo intolerante, prepotente, mesquinho, que vai até a insensibilidade moral" (TJSP - RJTJSP; 73/310).

STF:”(...) é fútil o motivo insignificante, mesquinho, manifestamente desproporcional em relação ao resultado e que, ao mesmo tempo, demonstra insensibilidade moral do agente” (RT 467/450)

STJ: “(...) a reação do réu a agressões verbais e físicas da vítima não caracteriza, por si só, a qualificadora do motivo fútil, prevista no artigo 121, § 2º, II, do CP” (RT 787/564) 

STJ: “(...) a não-identificação concreta de motivo não pode ser reconhecida como fútil” (RSTJ 157/545)

TJMG:”(...) é inaceitável que o motivo fútil e o motivo torpe coexistam para um único crime” (RT 614/291)

III - com emprego de veneno, (...); 

venefício -  exige-se prova pericial toxicológica 

III - com emprego de (...), fogo, explosivo, (...);

• Verificar a intenção do agente 
• Incendiar/Explodir – art. 251 c/c art. 258
• O dano gerado é absorvido

III - com emprego de (...), asfixia, (...); 

Impedimento da função respiratória
• mecânica - esganadura - estrangulamento - enforcamento - sufocação - afogamento / soterramento - imprensamento 
• tóxica - uso de gás - confinamento 

III - com emprego de (...), tortura, (......); 
  • Sujeita a vítima a graves e inúteis sofrimentos 
  • Deve ser aplicada antes da morte (concurso 211 CP) 
III - com emprego de (...) ou outro meio insidioso ou cruel (...);

Dissimulado – armadilha ou fraude (sabotagem)

"Meio cruel é todo aquele que produz padecimento físico inútil ou mais grave do que o necessário e suficiente para a consumação do homicídio. E meio bárbaro, martirizante, denotando, de parte do agente, a ausência de elementar sentimento de piedade" (TJSP - RJT/SP, 99/443). 

"Bater em velho até este morrer configura, iniludivelmente, a qualificadora do emprego de meio cruel" (TJSP - RT, 553/347). 

III - com emprego de (...) ou de que possa resultar perigo comum; 

TJSP: “Se os agentes para consumarem o homicídio disparam diversas vezes na rua, atingindo transeuntes, fica caracterizada a qualificadora prevista no artigo 121, § 2º, III, do CP, pois resultou perigo comum” (RT 771/583)

IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; 

TJSP: “Homicídio durante o amplexo sexual: traição caracterizada” (RT 458/337)

TJMG: “Desavença anterior: inexistência de traição” (RT 521/463)
  • Emboscada - tocaia
  • Dissimulação - engano (material ou moral)
"Age com a qualificadora da surpresa o marido que adentra o lar, quando sua esposa estava na cozinha, e a alveja, mortalmente, com diversos tiros de revólver, sem que a mesma pudesse esboçar qualquer defesa" (TJSC - RT, 523/438). 

V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:

TJMG:” Premeditação não é qualificadora” (RT 534/396)

Homicídio qualificado-privilegiado

É possível que o homicídio seja qualificado e privilegiado a mesmo tempo como, por exemplo, a eutanásia provocada por veneno. Isto só ocorre quando as qualificadoras forem de caráter objetivo (meios ou modos de execução).  

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm admitido a coexistência do homicídio qualificado e do homicídio privilegiado. O privilégio (circunstância subjetiva) pode coexistir com a qualificadora, desde que consista esta última em circunstância objetiva, referente ao meio e modo de execução do homicídio (RT, 528/397, 680/ 406 e 736/605).

STJ: “Admite-se a figura do homicídio privilegiado qualificado, sendo fundamental, no particular, a natureza das circunstâncias. Não há incompatibilidade entre circunstâncias subjetivas e objetivas, pelo que o motivo de relevante valor moral não constitui empeço a que incida a qualificadora da surpresa” (RT 680/406).

STF: “Há incompatibilidade no reconhecimento simultâneo do motivo fútil e do estado de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima – dois elementos estritamente subjetivos e de coexistência inadmissível” (RT, 585/420) 

Homicídio qualificado-privilegiado não é crime hediondo 

Circunstâncias subjetivas (privilegiadoras) são preponderantes 

Art. 67 - No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência 
  • Homicídio eutanásico com veneno
  • Pai que mata estuprador da filha por asfixia
De acordo com o posicionamento do STJ, não há incompatibilidade, em tese, na coexistência de qualificadora objetiva do crime de homicídio, como, por exemplo, a forma de executá-lo - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido - com a sua forma privilegiada - impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima.

Homicídio Culposo 

Artigo 121, § 3º - Se o homicídio é culposo: Pena – detenção, de um a três anos. 

Não queria causar a morte nem assumiu o risco de produzi-la Agiu com imprudência, negligência ou imperícia.

TAMG:”Age com imprudência e incide na sanção penal quem, a pretexto de proteger viveiro de pássaros, em lugar acessível a vizinhos, amigos e crianças, faz instalação elétrica que, ao simples e desprevenido contato com a tela, ocasiona a morte de uma delas” (RT 444/421)

Homicídio culposo qualificado 

Aumento de pena 

§ 4º No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. 

PERDÃO JUDICIAL 

Artigo 121, § 5º Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. 

"Para a concessão do perdão judicial, com fundamento no art. 121, § 5°, faz-se mister que o acusado demonstre as graves conseqüências que lhe atingiram, como o sofrimento ou as graves seqüelas decorrentes do sinistro" (TACrim - RJDTACrim, 25/73).

Súmula 18 (STJ): “ A sentença concessiva do perdão judicial tem natureza declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”










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