quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Da admissibilidade do homicídio qualificado-privilegiado

1. Introdução
Questão que tem intrigado a doutrina é se as circunstâncias privilegiadoras do § 1º do art. 121 do CP somente serão aplicadas ao homicídio simples (caput do art. 121) ou se tais circunstâncias são também aplicadas ao homicídio qualificado (§ 2º, art. 121), de maneira que a diminuição prevista no § 1º se estenda ao § 2º do mesmo artigo. Em outras palavras: é possível a admissibilidade do homicídio qualificado-privilegiado no Código Penal? Por exemplo, considera-se homicídio qualificado-privilegiado quando o sujeito mata a vítima impelido por um motivo de relevante valor moral, empregando fogo como meio de destruição da vida?
2. Da admissibilidade
A hipótese sob discussão é de conflito aparente de normas. Depende da natureza das circunstâncias a serem examinadas. As circunstâncias privilegiadoras, por serem circunstâncias subjetivas e por estarem relacionadas a pessoa do agente, repelem as circunstâncias qualificadoras subjetivas do § 2º (mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; por motivo fútil). Assim não pode invocar a minorante o agente que mata impelido por motivo de relevante valor moral e, ao mesmo tempo, determinado por motivo fútil. Tais circunstâncias não podem coexistir, pois se contradizem, são incompatíveis. O motivo de relevante valor moral anula o motivo fútil e vice-versa.
Todavia, as circunstâncias privilegiadoras, ínsitas no § 1º, do art. 121, podem concorrer com circunstâncias objetivas qualificadoras dos incisos III, IV e V do § 2º, do art. 121 (com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso, ou de que possa resultar perigo comum; à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime). Para responder a pergunta acima formulada o agente pode ser beneficiado com o privilégio se utilizar fogo como meio para matar a vítima, mas impelido por um motivo de relevante valor moral.
Esse é o entendimento sustentado por Damásio E. de Jesus, ao assinalar que existe perfeita compatibilidade entre uma circunstância de caráter subjetivo e outra de caráter objetivo, asseverando:
“O conflito ocorre entre as circunstâncias legais especiais. As circunstâncias legais contidas na figura típica do homicídio privilegiado são de natureza subjetiva. Na do homicídio qualificado, algumas são objetivas (§ 2º, III,IV e V, salvo a crueldade), outras, subjetivas (ns. I e II). De acordo com nossa posição, o privilégio não pode concorrer com as qualificadoras de natureza subjetiva. Não se compreende homicídio cometido por motivo fútil e, ao mesmo tempo, de relevante valor moral. Os motivos subjetivos determinantes são antagônicos. O privilégio, porém, pode coexistir com as qualificadoras objetivas. Admite-se .homicídio eutanásico cometido mediante veneno. A circunstância do relevante valor moral (subjetiva) não repele o elemento exasperador objetivo. O mesmo se diga do fato de alguém matar de emboscada e impelido por esse motivo” .
Luiz Régis Prado completa o pensamento afirmando:
É de enfatizar-se, nesse passo, que são havidas como circunstâncias preponderantes aquelas que resultam dos motivos determinantes do crime (art. 67, CP). Confere-se, pois, maior relevo às circunstâncias que influem na medida da culpabilidade, agravando ou atenuando a reprovabilidade pessoal da conduta típica e ilícita (v.g. motivo fútil, torpe, de relevante valor social ou moral).
Não é possível, porém, no delito de homicídio, admitir a coexistência de um privilégio e de uma qualificadora que atuem exclusivamente sobre a magnitude de sua culpabilidade. No entanto, admite-se o concurso de um privilégio e de uma circunstância qualificadora que afete apenas a magnitude do injusto, importando em maior desvalor da ação (art. 121, § 2º, III).
De acordo com a admissibilidade da coexistência entre privilegiadora e qualificadora no homicídio, o acórdão do Superior Tribunal de Justiça faz-se no mesmo entendimento:
Origem: STJ
Classe: RE – STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 922932 SP 2007/0028150-1
Data da decisão: 12/12/2007
Relator: Ministro FELIX FISCHER
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO-PRIVILEGIADO. COMPATIBILIDADE ENTRE QUALIFICADORA INSERTA NO ART. 121, § 2º, INCISO IV COM A FORMA PRIVILEGIADA. POSSIBILIDADE.
I - Não há incompatibilidade, em tese, na coexistência de qualificadora objetiva (v.g. § 2º, inciso IV) com a forma privilegiada do homicídio, ainda que seja a referente à violenta emoção. (Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso).
II - Assim, a resposta afirmativa ao quesito atinente a forma privilegiada do crime de homicídio não implica a prejudicialidade do quesito que indagaria aos jurados acerca da qualificadora inserta no art. 121, § 2º inciso Ivdo CP (recurso que dificultou a defesa da vítima). Recurso especial provido (grifo nosso)
Como bem mostra o acórdão acima referido, pode o júri reconhecer a circunstância privilegiadora (agiu sob domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima) e a circunstância qualificadora (empregou meio que dificultou ou impossibilitou a defesa) ao mesmo tempo. Observa-se que neste acórdão as circunstâncias obedecem aos casos anteriormente sustentados em que só há conexão entre as qualificadoras objetivas (art. 121, § 2º, III, IV e V, salvo a crueldade) e as privilegiadoras subjetivas (art. 121, § 1º), não havendo incompatibilidade entre elas.
Tal entendimento consolida o fato de que, no homicídio qualificado-privilegiado, somente as circunstâncias objetivas da conduta qualificadora e as subjetivas da conduta privilegiadora se coadunam, isto é, se encaixam na seqüência lógica dos fatos. A circunstância do relevante valor moral (subjetiva) não repele o elemento exasperador objetivo da qualificadora.
A partir desse pensamento pode-se concluir que uma circunstância qualificadora subjetiva conjugada com a privilegiadora seria impossível, pois ambas seriam subjetivas, não podendo a consciência humana agir por motivo de relevante valor moral e por motivo fútil ao mesmo tempo, pois são circunstâncias antagônicas, se repelem.
Conclui-se então que só é admissível o homicídio em tese, se as circunstâncias qualificadoras forem objetivas e as privilegiadoras que são sempre subjetivas, trazendo à tona conseqüências que, para o agente, trazem uma grande elasticidade na sua área defensiva.
Tem-se que tal alargamento advém da imediata impossibilidade de o homicídio qualificado-privilegiado ser um crime hediondo. A Lei 8072/90 prescreve somente a figura do homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, I, II, III, IV e V), demonstrando apenas o interesse pelas circunstâncias qualificadoras.
Inicialmente, a Lei dos crimes hediondos não considerava como tal o homicídio qualificado, sendo incluída apenas quatro anos depois com a Lei 8930/94, com o objetivo de tão somente considerar como hediondo essa modalidade de homicídio e alguns outros crimes elencados no CP. Se houvesse a intenção do legislador em incluir como hediondo o homicídio qualificado-privilegiado já o teria feito oportunamente nessa lei, não deixando margem de interpretações extensivas.
Outra conseqüência é a competência do homicídio qualificado-privilegiado pelo Tribunal do Júri. Reconhecendo o privilégio pelos jurados, não fica ao arbítrio do julgador diminuir ou não a pena, pois a faculdade se refere apenas na quantidade da pena a ser aplicada dentre as possibilidades previstas na lei, pois reconhecido o homicídio qualificado-privilegiado, a inobservância da redução da pena implicará em violação de preceito constitucional contido em seu art. 5º, XXXVIII, alínea c, que impõe a soberania dos veredictos.
3. Conclusão
Assim sendo, constata-se que o homicídio qualificado-privilegiado é um crime praticado contra a vida humana, podendo englobar diversas peculiaridades (qualificadoras objetivas e privilegiadoras em concomitância no delito), aos quais irão influir diretamente na dosagem da pena. Demais disso, dentro da sistemática da ação penal, dada a importância deste tipo incriminador, a ação penal para a sua apuração será pública incondicionada de caráter especial, retirando a hediondez do delito e dando competência ao Tribunal do Júri quanto a classificação do crime. E, com isso, obrigando o juiz presidente a aplicar pena que diminui a condenação do agente.
Concluindo-se, assim, pela conseqüente confirmação da admissibilidade do homicídio qualificado-privilegiado no Código Penal Brasileiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Alan de Almeida. Da admissibilidade do homicídio qualificado-privilegiado. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 set. 2010. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.29015&seo=1>.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

O que é Vitriolagem?

Vitriolagem vem de vitríolo. E vitríolo é a designação comum dos ácidos azótico, clorídrico, sulfúrico, etc., que são substancias cáusticas, substâncias que queimam. Vitriolagem é o crime que resulta do arremesso dessas substâncias sobre o rosto, ou outras partes do corpo, produzindo queimaduras e, muitas vezes, deformidades permanentes horríveis.

A vitriolagem é geralmente motivada por ciúme e o objetivo é a vingança. Como exemplo, temos o caso da Duquesa de Chaulnes, que se encaminhava para a sua casa, quando lhe lançaram ácido azótico sobre o rosto, deformando-o de maneira impressionante. Ela que era uma mulher linda, tornou-se horrorosa.

Os Crimes de amor continuam aumentando?

O maior advogado de defesa dos chamados " crimes de amor" foi o grande penalista italiano Enrico Ferri, que conseguiu impressionar o mundo com os seus argumentos. 

No Brasil, o antigo Código Penal, de 1890, art. 27, § 4º, estabelecia que: "Não são criminosos os que se acham em estado de completa perturbação de sentidos e de inteligência no ato se cometer o crime". Este preceito legal levava à absolvição todos os chamados criminosos passionais.

Estimulados pela imunidade , os amorosos - não só no Brasil, mas no mundo inteiro - passaram a lavar em sangue toda e qualquer "honra ferida". Foi quando, em 1930, Leon Rabinowicz, professor de Direito Penal da Universidade de Varsóvia, deu um grito de "Basta!", através do seu livro "O crime passional". Neste trabalho, o autor demonstra que o chamado "crime de amor" nada tem de sublime sentimento, e que os seus componentes são, apenas, o orgulho ferido, o ódio e a vingança. 

Aquele mestre fez, logo, entre os penalistas, uma legião de adeptos, que influíram decisivamente na elaboração dos novos Códigos Penais. No Brasil, o novo estatuto criminal, de 1940, no art. 24, deixou claro que "a emoção e a paixão" não excluem a responsabilidade penal, constituindo, apenas, circunstâncias atenuantes. E, mais precisamente, enquadrou os passionais - os autênticos passionais - no art. 121, § 1º, isto é, no chamado homicídio privilegiado, cuja pena corresponde a cerca de quatro anos de reclusão.

Relativamente os falsos passionais, sempre que agirem com a perversidade ou à traição, o Código os sujeitou a uma pena que vai de 12 a 30 anos. Diante dessa guinada - que substitui a impunidade pela responsabilidade - os chamados "crimes de amor" diminuíram sensivelmente.

O mestre da Universidade de Varsóvia, diz que existem três formas de amor: o platônico, o afetivo e o sexual. E os define afirmando que, no primeiro caso, marido e mulher são dois amigos; no segundo, são amigos e amantes; e no terceiro, são apenas amantes. Explica, mais, que o amor platônico nunca leva ao crime; que o afetivo pode levar ao suicídio e, raramente, ao crime - quando, então, o criminoso é um autêntico passional; e que o sexual, por ser profundamente egoísta, "fornece a imensa maioria dos supostos crimes passionais, para não dizer a sua totalidade".

Ainda segundo o mestre, a mulher constantemente perdoa. às vezes se suicida. Mas se resolve vingar-se, "passa a ser um monstro de ferocidade, que só respira vingança e só pensa em submeter a sua vítima aos mais atrozes sentimentos", recorrendo muitas vezes à vitriolagem.


segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

SÚMULA N. 214 STJ - Fiança.



EMENTA

Civil. Locação. Fiança. 

I - O artigo 1.483 do Código Civil dispõe expressamente que a fiança deve se dar por escrito e não admite interpretação extensiva. Assim sendo, se houve o ajustamento do valor da locação maior do que estipulado no contrato, com a transigência da locatária, os fiadores não estarão obrigados a responder pelo débito cobrado, não havendo que se falar em “assentimento tácito”. 

II - Recurso provido, a fim de que sejam excluídos do débito os valores cobrados em decorrência do reajuste extracontratual, sem prejuízo de liquidez, certeza e exigibilidade do título exequendo.

O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Donas de casa também têm direito a receber aposentadoria


Basta contribuir por, pelo menos, 15 anos com a Previdência.
Para ter esse direito, existem três tipos de contribuição possíveis.

A aposentadoria para donas de casa é um benefício que pouca gente conhece. Para não perder esse direito, elas precisam ficar atentas às regras.

As donas de casa não param, nem ganham salário, mas podem receber aposentadoria, desde que contribuam com a previdência por, pelo menos, por 15 anos.

São três formas de contribuição, uma delas garante uma aposentadoria maior do que o salário mínimo. Para conseguir, a pessoa deve contribuir com 20% sobre um valor que fique entre o mínimo e o teto da previdência (R$ 4.663,75). Neste caso, as contribuições vão de R$ 157 a R$ 932,75 por mês. Essa é a única opção que permite se aposentar só pelo tempo de contribuição e não pela idade mínima que, para as mulheres, é de 60 anos.

Outra possibilidade é pagar 11% do salário mínimo a cada mês, R$ 86,68. No caso das mulheres de baixa renda, 5%, o equivalente a R$ 39,40. Nesses dois casos, a dona de casa precisa esperar fazer 60 anos para receber um salário mínimo de aposentadoria.

Para se inscrever como contribuinte, a dona de casa só precisa ter em mãos um documento de identidade, mas é importante ficar atenta ao que vai declarar à Previdência. Para ser reconhecida como de baixa renda, por exemplo, ela não pode ter nenhum tipo de renda, mesmo que informal. “Para ser configurado como segurado facultativo de baixa renda, tem que ter uma renda familiar de até dois salários mínimos”, explica Débora Teixeira, chefe da Divisão de Benefícios do INSSCE.

A Previdência leva em conta o tempo de contribuição de mulheres que já trabalharam com carteira assinada. Antes de virar dona de casa, Lucia Sales trabalhou no comércio por 13 anos. Agora, vai voltar a contribuir para ter a tão sonhada aposentadoria. “Para mim é uma recompensa e eu tenho fé em Deus que vai dar certo”, comemora.

Como pedir a aposentadoria
A inscrição pode ser feita por telefone, pelo canal 135 (de segunda a sábado, das7h as 22h); pelo site da Previdência (www.previdencia.gov.br); ou em qualquer unidade de atendimento das agências da Previdência Social em todo o Brasil.

Feminicídio passa a ser considerado crime hediondo




 
Altera o art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o O art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Homicídio simples
Art. 121. 
§ 2o 
Feminicídio
VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:
§ 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:
I - violência doméstica e familiar;
II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
Aumento de pena
§ 7o A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:
I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto;
II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;
III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima.” (NR)
Art. 2o O art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, passa a vigorar com a seguinte alteração:
“Art. 1o  .........................................................................
I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV, V e VI);
...................................................................................” (NR)
Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
Brasília, 9 de março de 2015; 194o da Independência e 127o da República.
DILMA ROUSSEFF
José Eduardo Cardozo
Eleonora Menicucci de Oliveira
Ideli Salvatti
Este texto não substitui o publicado no DOU de 10.3.2015

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

O Espírito Científico

O espírito científico – inspirado no Iluminismo – esteve na raiz da produção de uma visão mais secularizada e reflexiva sobre as formas de vida dos homens.

E foi exatamente essa autonomia do objeto que permitiu à sociologia se consolidar como um ramo especializado do saber, distinto da biologia e da psicologia.

A sociologia foi impulsionada pela descoberta de um novo espaço da existência humana – a sociedade.

Na medida em que ficava evidente a historicidade e a contingência das formas de vida dos homens, tornava-se necessário construir argumentos específicos que dessem conta desse novo objeto.


Iluminismo

É consensual entre os historiadores que o Iluminismo representou a grande mudança intelectual que abriu as portas para uma reflexão sobre o mundo social.

Até então, a vida cotidiana parecia regida por uma segurança ontológica, como se todas as dimensões da vida - trabalho, família e lazer - estivessem organicamente integradas e fossem explicadas por costumes, tradições e hábitos inquestionáveis.

Não existia, propriamente, um pensamento autônomo sobre o que chamamos hoje de social, pois a religião produzia uma visão global sobre o mundo e seus processos.

De certa maneira, não se concebia que as relações entre os homens pudessem ser destacadas como objeto de conhecimento científico. 

O que conhecemos hoje como Iluminismo produziu uma significativa mudança na maneira de pensar.

Segundo Ernest Cassirer, a reflexão iluminista discernia, claramente, entre um sujeito pensante e um mundo - o objeto - regido por mecanismos e processos objetivos, que deveriam ser conhecidos e traduzidos em hipóteses e leis.

É difícil de identificar a data de nascimento da sociologia, ainda mais se a tomarmos como uma forma de argumentação.

Embora seja impossível falar apenas de um iluminismo, - já que existiriam distintas tradições intelectuais associadas ao termo - Cassirer acredita que pode discernir certa atitude mental comum. E é essa atitude que nos interessa para a história da sociologia.

Charles-Louis de Secondato - o Barão de Montesquieu -, ao escrever a sua mais famosa obra, O Espírito das Leis, mostrou ser possível não apenas identificar leis que ordenam a política e o Estado, como também os costumes e hábitos sociais que condicionam a existência e o sucesso dessas leis.

Ao identificar relações causais que explicariam, ao menos parcialmente, a diversidade de regimes políticos existentes, Montesquieu abria a possibilidade de identificar o social como uma esfera específica da vida humana.

Para Montesquieu, essa esfera era regida por processos e causas que não dependeriam, totalmente, do livre-arbítrio dos homens. 




Iluminismo, Positivismo e Industrialismo - História da Sociologia

Segundo Wrigth Mills, a imaginação sociológica poderia ser aprendida e exercitada por qualquer pessoa educada que se mostrasse curiosa sobre as relações entre biografia e História. E a sociologia não seria simplesmente uma disciplina acadêmica ou uma ciência ultrassofisticada...

A sociologia seria uma forma de argumento público capaz de revelar as conexões entre transformações na vida cotidiana e processos mais amplos de mudança histórica.

Logo, contar a história da sociologia é mais do que, simplesmente, descrever autores, escolas de pensamento e instituições.

Temos de estar atentos às distintas formas pelas quais esse tipo de imaginação sociológica se consolidou na Europa e foi recepcionada no Brasil.

A imaginação sociológica nos permite destacar...
  • a especificidade do vocabulário utilizado pela sociologia;
  • os distintos modelos de imaginação sociológica existentes no Velho Continente;
  • as singularidades do pensamento social no Brasil.
A imaginação sociológica nos permitirá compreender como a sociologia se fez presente nos mais diferentes debates contemporâneos travados no nosso País a respeito de temas e questões que nos afligem. 






Magistrado

Por Emerson Santiago

É atribuído o nome de magistrado à pessoa que recebeu poderes da nação ou do governo central para governar ou administrar a justiça. Tal designação cabe aos desembargadores, ministros, juízes, administrador ou governador. O presidente da república é considerado o primeiro magistrado da nação, aquele que detém a mais alta autoridade política e administrativa. Popularmente, o termo é mais utilizado em meio à área jurídica, para se referir aos cargos de chefia dentro da hierarquia do poder judiciário.

O termo magistrado tem origem na língua latina, derivada da palavra magistratus, que por sua vez surgiu de magister, palavra que significa "chefe" ou "superintendente". A palavra latina magistratus tanto significa o cargo de governar (magistratura) como pessoa que governa (magistrado). Em suma, era um funcionário do poder público investido de autoridade. Na antiguidade eram diversos os magistrados, como os cônsules, os pretores, os censores, considerados magistrados maiores, e os edis e questores, os magistrados menores. Os magistrados são detentores do imperium, um poder absoluto anteriormente atribuído apenas aos reis, um poder de soberania, aos quais os cidadãos não podiam opor-se.

No mundo contemporâneo a palavra magistrado encontra-se fortemente associada ao exercício do poder judiciário. Os países cuja estrutura legal é baseada no Direito Romano (Itália, França, Alemanha, Espanha ou Portugal), têm no seu corpo de magistrados juízes e procuradores ou promotores. Tal noção de magistratura é desconhecida nos países que adotam a common law.

No Brasil, os magistrados são tão somente os juízes, membros do Poder Judiciário, apesar de ambas as categorias (magistrados e membros do Ministério Público) gozarem das garantias constitucionais de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos.

Com relação à questão da promoção, cada nova vaga aberta é preenchida por antiguidade e merecimento, sucessivamente. Importante salientar que a aceitação da promoção não é obrigatória, o contemplado pode recusá-la. A promoção por merecimento decorre do talento e desempenho da pessoa. Já a promoção por antiguidade resulta do tempo que aquela pessoa ocupa seu cargo atual (normalmente conhecida como ‘entrância’).

Se a vaga a ser preenchida for por merecimento, o tribunal prepara uma lista com três nomes (lista tríplice). Caso a vaga a ser preenchida for por antiguidade, o tribunal escolhe um único nome. No caso de nomeação de advogados ou membros do Ministério Público para um tribunal é sempre do chefe do Executivo, seja presidente da República ou governador, dependendo da esfera de poder. Tal prerrogativa faz parte do controle mútuo entre os poderes.

UNIÃO ESTÁVEL - Jurisprudências

As teses aqui resumidas foram elaboradas pela Secretaria de Jurisprudência, mediante exaustiva pesquisa na base de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.


1) Os princípios legais que regem a sucessão e a partilha não se confundem: a sucessão é disciplinada pela lei em vigor na data do óbito; a partilha deve observar o regime de bens e o ordenamento jurídico vigente ao tempo da aquisição de cada bem a partilhar.

2) A coabitação não é elemento indispensável à caracterização da união estável. 

3) A vara de família é a competente para apreciar e julgar pedido de reconhecimento e dissolução de união estável homoafetiva.

4) Não é possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas. 

5) A existência de casamento válido não obsta o reconhecimento da união estável, desde que haja separação de fato ou judicial entre os casados. 

6) Na união estável de pessoa maior de setenta anos (art. 1.641, II, do CC/02), impõe-se o regime da separação obrigatória, sendo possível a partilha de bens adquiridos na constância da relação, desde que comprovado o esforço comum. 

7) São incomunicáveis os bens particulares adquiridos anteriormente à união estável ou ao casamento sob o regime de comunhão parcial, ainda que a transcrição no registro imobiliário ocorra na constância da relação. 

8) O companheiro sobrevivente tem direito real de habitação sobre o imóvel no qual convivia com o falecido, ainda que silente o art. 1.831 do atual Código Civil. 

9) O direito real de habitação poder ser invocado em demanda possessória pelo companheiro sobrevivente, ainda que não se tenha buscado em ação declaratória própria o reconhecimento de união estável. 

10) Não subsiste o direito real de habitação se houver co-propriedade sobre o imóvel antes da abertura da sucessão ou se, àquele tempo, o falecido era mero usufrutuário do bem. 

11) A valorização patrimonial dos imóveis ou das cotas sociais de sociedade limitada, adquiridos antes do início do período de convivência, não se comunica, pois não decorre do esforço comum dos companheiros, mas de mero fator econômico. 

12) A incomunicabilidade do produto dos bens adquiridos anteriormente ao início da união estável (art. 5º, § 1º, da Lei n. 9.278/96) não afeta a comunicabilidade dos frutos, conforme previsão do art. 1.660, V, do Código Civil de 2002. 

13) Comprovada a existência de união homoafetiva, é de se reconhecer o direito do companheiro sobrevivente à meação dos bens adquiridos a título oneroso ao longo do relacionamento. 

14) É inviável a concessão de indenização à concubina, que mantivera relacionamento com homem casado, uma vez que tal providência daria ao concubinato maior proteção do que aquela conferida ao casamento e à união estável.

15) Compete à Justiça Federal analisar, incidentalmente e como prejudicial de mérito, o reconhecimento da união estável nas hipóteses em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário.

 Os entendimentos foram extraídos de precedentes publicados até 18 de dezembro de 2015.

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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Direitos do Consumidor


TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Expressões corretas


Deve-se escrever corretamente: aberratio ictus (erro, ou desvio do golpe), aberratio personae (erro de pessoa), aberratio rei (erro da coisa). E mais: a contrario sensu (pela razão contrária), actio empti, ou actio ex empto (ação do comprador), ad corpus e ad mensuram (por corpo e por medida, ad causam (para a causa) etc. 

Outros exemplos (corretos): abusus non tollit usum (o abuso não tira o uso), animus (ânimo, intenção, vontade), animus adiuvandi (intenção de ajudar), animus acquirendi ou adquirendi (intenção de adquirir), animus occidendi (intenção de matar), ante acta (antes dos atos, isto é, preliminarmente), ante tempus (antes do tempo, igual a ante diem).

Lato sensu (em sentido lato, sentido amplo) nunca deve ser escrito “latus sensus”, ou “lato sensus”. Assim também: a contrario sensu (pela razão contrária), more uxório (segundo o costume de casado), mora ex persona, mora ex re (mora proveniente da pessoa, ou da coisa), in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu), in concreto e in abstracto (em concreto, em abstrato), in extenso (por extenso), in verbis (nestes termos), in singulis (por cabeça, por cada um), in limine (liminarmente), clausula rebus sic stantibus (permanecendo assim as coisas). São casos de ablativo, usado no latim para indicar tempo, modo, fim, causa, condição e outras circunstâncias adverbiais. 

Juiz “a quo” 

Agora, uma questão que tem causado certa perplexidade. Costuma-se dizer “juiz a quo” (juiz do qual se recorre). Então, alguns apressados passaram a escrever “juíza a qua” (juíza da qual se recorre), porque “qua” é o feminino de “quo”. Mas sem razão, porque na verdade, o recurso é da decisão proferida no juízo inferior, portanto, sempre deve ser “a quo”, nunca “a qua”. E o recurso é sempre dirigido ao tribunal “ad quem” (para o qual se recorre). 

“Status” e “data venia”

Statu quo (ante) significa “no estado em que se encontrava (antes). Já status quer dizer “estado”, isto é, a condição de uma coisa ou de uma pessoa, no sentido puramente jurídico, como casado, solteiro, divorciado etc. 

Já “data venia” (com licença, com a devida vênia) não leva acento, porque nenhuma palavra latina deve ser acentuada. Nunca usar as variantes “datissima venia” ou “data venia concessa”, expressões que não existem na boa linguagem jurídica.

Para quem gosta do latim, recomenda-se o “Dicionário de Latim Forense”, de Amilcare Carletti, LEUD – Livraria e Editora Universitária de Direito, de onde extraímos as lições acima.

TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Emprego de Expressões Latinas

Na linguagem forense, é comum o uso de expressões latinas. Mas recomenda-se que tal prática se restrinja aos casos em que há real necessidade do emprego dessas expressões, que em geral podem ser substituídas facilmente por palavras portuguesas, em benefício da clareza e simplicidade do texto.

Recordando princípios básicos, no latim os substantivos, os adjetivos e os pronomes têm declinação, isto é, sua desinência (ou terminação) modifica-se conforme o caso. Temos então:

a) o nominativo indica o sujeito – Dominus est bonus (o senhor é bom); 

b) o genitivo corresponde ao nosso adjunto adnominal – Potestas domini (o poder do senhor) – Dominus litis (o senhor da lide);

c) o dativo é o caso do objeto indireto ou do objeto direto preposicionado – Dare domini (dar ao senhor);

d) o acusativo indica o objeto direto – Dominum laudare (louvar o senhor); 

e) o ablativo é usado como agente da passiva, complemento de tempo, lugar, modo, fim, causa, condição etc – Domino iuvante (com ajuda do senhor) – In illo tempore (naquele tempo);

f) o vocativo, quando há uma invocação, apelo ou chamado – Domine, supplico te (senhor, te suplico).

Por isso, é necessário ter cuidado nas citações, para não confundir os vários casos de cada declinação (são cinco declinações, cada uma com seis casos no singular e seis no plural). Por exemplo, deve-se escrever inaudita altera parte (não ouvida a outra parte), com o uso do ablativo, porque se trata de uma circunstância de modo (de que modo? – resposta: sem ser ouvida a outra parte). É errado usar “inaudita altera pars”, no nominativo, que não corresponde àquela circunstância de modo. Pior ainda “inaldita”, palavra inexistente no latim. Não confundir com a expressão audiatur et altera pars, que significa “ouça-se a outra parte” (princípio do contraditório), porque aqui “altera pars” é o sujeito da forma passiva do verbo “audiatur” (ouçase).

As citações em latim devem ser destacadas em itálico (prima facie = à primeira vista), em negrito (in extenso = por extenso) ou entre aspas (“pro tempore” = segundo as circunstâncias, conforme o tempo). Admite-se que uma ou outra expressão, já incorporada ao português, possa dispensar esse destaque: quantum, quorum, referendum, de cujus, a quo etc.

TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Redação de Atos Normativos

1. O parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal reza que “lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis”.

2. Em conseqüência, foi promulgada a Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que “dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme dispõe o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que menciona”.

3. Essa lei complementar foi regulamentada pelo Decreto nº 2.954, de 29 de janeiro de 1999.

4. No que interessa à redação jurídica, é oportuno mencionar aqui o art. 11 da citada Lei Complementar nº 95/98, que dispõe que as disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas:

5. Para a obtenção de clareza: 

a) usar as palavras e as expressões em seu sentido comum, salvo quando a norma versar sobre assunto técnico, hipótese em que se empregará a nomenclatura própria da área em que se esteja legislando;

b) usar frases curtas e concisas; 

c) construir as orações na ordem direta, evitando preciosismo, neologismo e adjetivações dispensáveis; 

d) buscar a uniformidade do tempo verbal em todo o texto das normas legais, dando preferência ao tempo presente ou ao futuro simples do presente; 

e) usar os recursos de pontuação de forma judiciosa, evitando os abusos de caráter estilístico; 

6. Para a obtenção de precisão:

a) articular a linguagem, técnica ou comum, de modo a ensejar perfeita compreensão do objetivo da lei e a permitir que seu texto evidencie com clareza o conteúdo e o alcance que o legislador pretende dar à norma;

b) expressar a ideia, quando repetida no texto, por meio das mesmas palavras, evitando o emprego de sinonímia com propósito meramente estilístico; 

c) evitar o emprego de expressão ou palavra que confira duplo sentido ao texto; 

d) escolher termos que tenham o mesmo sentido e significado na maior parte do território nacional, evitando o uso de expressões locais ou regionais; 

e) usar apenas siglas consagradas pelo uso, observado o princípio de que a primeira referência no texto seja acompanhada de explicitação de seu significado; 

f) grafar por extenso quaisquer referências a números e percentuais (trinta, dez, vinte e cinco, duzentos e trinta e cinco; zero vírgula zero duzentos e trinta e quatro por cento; dois vírgula quinze por cento; etc.), exceto data (4 de março de 1998, 1º de maio de 1998) , número de lei (Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990) e nos casos em que houver prejuízo para a compreensão do texto;

g) indicar expressamente o dispositivo objeto de remissão, em vez de usar as expressões ‘anterior’, ‘seguinte’ ou equivalentes; 

7. Para a obtenção de ordem lógica (texto aqui adaptado apenas à redação jurídica): 

a) restringir o conteúdo de cada parágrafo a um único assunto ou princípio;

b) expressar por meio de outros parágrafos os aspectos complementares ao tema tratado; 

c) não alongar os parágrafos nem as citações (que devem conter apenas o essencial, relativo ao tema objeto do texto); 

d) observar o antecedente, para afirmar o conseqüente;

e) usar, quando possível, a forma do silogismo para as demonstrações e argumentações.

TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Normas da Corregedoria


A boa redação inclui não apenas a correção gramatical, com emprego de linguagem simples e objetiva, como também requisitos relativos à boa apresentação gráfica do texto. 

No tocante aos processos, há normas da Corregedoria Geral da Justiça, que devem ser observadas pelo Cartório e seus escreventes, as quais estão coligidas em fascículos e disquetes atualizados. 

Importante notar que os carimbos devem ser limpos, bem aplicados nas folhas do processo e corretamente preenchidos, com letra legível, caneta esferográfica azul ou preta (não se tolera o uso de cores extravagantes: vermelho, verde, roxo etc.). Seria melhor que os termos do processo fossem digitados; mas enquanto não forem abolidos os velhos carimbos, que pelo menos sejam usados de forma correta.

A numeração das folhas do processo deve ser legível, no canto superior direito; evite-se riscar numerações já existentes, para substituí-las por outros números, o que resulta em borrões e confusão. 

De preferência, não se deve escrever no verso da folha, mas sim utilizá-la só de um lado; não parece que seja necessário inutilizar o anverso, com um risco longitudinal, ou qualquer outra sinalização.

Cada volume de processo deve conter somente duzentas folhas, formando-se novo volume sempre que esse número, ou seu múltiplo (quatrocentas, seiscentas folhas), for atingido. Assim também a juntada de documentos, furos nos papéis a serem entranhados aos autos, a autuação, o emprego de grampos adequados, tudo deve ser bem cuidado. 

Essas e outras normas, em geral ditadas pela experiência e pelo bom-senso, devem ser seguidas pelos Escreventes, sob a fiscalização do Diretor do Cartório e orientação do Juiz da respectiva Vara, todos procurando zelar pela boa apresentação dos autos, por maiores que sejam as dificuldades e deficiências materiais ocorrentes.

TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Maiúsculas, citações e formatação

1. Não abuse das maiúsculas: Pontes de Miranda, “Tratado de Direito Privado”, XV/12; Washington de Barros Monteiro, “Direito de Família”, p. 35; RT-620/170; Theotonio Negrão, nota 6 ao art. 420, in CPCLPV, 34ª ed. Não se deve escrever o nome todo do autor e da obra em “caixa alta” (maiúsculas): PONTES DE MIRANDA, “TRATADO”... (apenas as iniciais devem ser maiúsculas). Se a obra for muito conhecida e citada, não é preciso detalhar dados da edição, editora, ano etc.; pode-se resumir, como indicado nos exemplos acima.

2. Se quiser destacar uma expressão, um nome ou uma citação, use itálico; use negrito; sublinhe as palavras. Mas sem exagero: quanto menos destaques, melhor. 

3. Adote o espaçamento médio, normal (simples ou 1,5). Usar a fonte “times new roman” ou semelhantes – tamanho 12 ou 14, estilo normal. Margem superior – 4,5 cm; inferior – 4,0 cm; esquerda – 4,5 cm; direita – 2,5 cm; cabeçalho – 3,8 cm; rodapé – 2,5 cm. 

4. Usar impresso oficial, timbrado, em decisões e pareceres; impresso próprio, em petições, arrazoados e memoriais. De preferência, padronizar tais impressos, em papel branco, tamanho oficial. Não se recomenda a utilização de impressos da OAB, existentes na Sala dos Advogados, a não ser em casos excepcionais, de muita urgência; é mais elegante e profissional que o advogado redija as petições no escritório, utilizando impressos próprios. 

5. Em geral, digitar textos; evitar os manuscritos, a não ser em breves despachos, decisões ou manifestações nos autos (nestes casos, letra legível). Não escreva no verso: use apenas um lado da folha. Despachos e decisões devem ser redigidos pelo próprio juiz, que evitará assinar os preparados em Cartório.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Tratamento formal

1. Vossa Excelência: Presidente da República e Vice; Ministros, Governadores e Vices; Prefeitos Municipais; Secretários Estaduais, Membros do Poder Legislativo e Judiciário; Oficiais-Generais.

 2. O vocativo a ser empregado em comunicações dirigidas a essas autoridades é Excelentíssimo Senhor, seguido do cargo respectivo: Excelentíssimo Senhor Presidente do Tribunal de Justiça.

 3. As demais autoridades serão tratadas com o vocativo Senhor, seguido do cargo respectivo: Senhor Juiz, Senhor Ministro.

 NOTA – A técnica de citação de leis (itens 2.1.1 a 2.1.8) tem por fundamento as normas constantes da Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998. Já as regras de tratamento formal constam da Instrução Normativa nº 4, de 6 de março de 1992, da Secretaria da Administração Federal (DOU 9.3.92) e do Decreto Estadual nº 11.074, de 5 de janeiro de 1978.

 4. Exemplo de um ofício protocolar:

São Paulo, 15 de janeiro de 2004.

 Senhor Presidente:

 Tenho a honra de convidar Vossa Excelência para as solenidades comemorativas do 30º aniversário da instalação da Comarca de ..., que se realizarão no Fórum local, no próximo dia 20 de abril, a partir das 10:00 horas, conforme programa anexo.
.......................................(outras informações úteis ou necessárias). 

Apresento a Vossa Excelência, ao ensejo, os meus protestos de estima e consideração.



ALEXANDRE DOS SANTOS
Juiz de Direito

Ao Excelentíssimo Senhor
Desembargador JOSÉ DE CAMPOS CAMARGO
Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo




TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Citação de Leis



1. No texto jurídico (petição, memorial, sentença), a primeira referência deve indicar o número da lei, seguido da data, sem abreviação do mês e ano: Lei nº 4.860, de 26 de novembro de 1965. Nas referências seguintes serão indicados apenas o número e o ano: Lei nº 4.860, de 1965; ou Lei nº 4.860/65.

 2. Os artigos de lei são citados pela forma abreviada “art.”, seguido de algarismo arábico e do símbolo do numeral ordinal (º) até o de número 9, inclusive; a partir do 10, usa-se só o algarismo arábico. Assim: art. 1º, art. 2º, art. 3º .... art. 9º; art. 10, art. 11, art. 20, art. 306, art. 909 etc.

3. Os incisos são designados por algarismos romanos, seguidos de hífen (ver art. 125 do CPC, abaixo).

4. O texto de um artigo inicia-se por maiúscula e termina por ponto, salvo nos casos em que contiver incisos, quando deverá terminar por dois pontos. Exemplo:

Dispõe o Código de Processo Civil:

“Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:

I - assegurar às partes igualdade de tratamento;
II - velar pela rápida solução do litígio;
III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça.”
IV - tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.”

5. Quando um artigo tiver mais de um parágrafo, estes serão designados pelo símbolo §, seguido do algarismo arábico correspondente; a grafia é por extenso, nas referências a parágrafo único, parágrafo seguinte. parágrafo anterior e semelhantes. Ex.: os §§ 2º e 3º do art. 15...; o parágrafo único do art. 12...

6. As alíneas ou letras de um inciso ou parágrafo deverão ser grafadas com letra minúscula, seguida de parêntese: “De acordo com o § 3º, alíneas a) a c) do art. 20 do CPC (ou alíneas “a” a “c” do CPC).

7. As datas devem ser escritas por extenso: 2 de maio de 1970 (não se escreve 02 de maio de 1.970); o ano não tem ponto, mas o número da lei tem: Lei nº 5.450, de 2 de maio de 1970 (Errado: Lei 5440, de 02.05.70 ou 1.970). Lembrete, para memorizar: “lei” (com i) tem
ponto, logo o número da lei também tem ponto (Lei nº 5.450/70); “ano” (sem i) não tem ponto, portanto a indicação do ano não leva ponto (em 2002 o Brasil conquistou o pentacampeonato; 2004 é o ano da Olimpíada de Atenas).

8. DECRETOS - A mesma técnica acima. Escreve-se: O Decreto-lei nº ou o Dec.- lei nº; o Decreto Estadual nº, a Lei Municipal nº. A abreviação de número é nº (não n.).







 


TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Criatividade


Escrevendo, descubro sempre um novo pedaço de infinito.
Vivo no infinito; o momento não conta.
(João Guimarães Rosa)

Escrever com amor é o melhor meio de escrever bem. Quem gosta do que faz realiza seu trabalho com prazer e realiza-o bem; os preguiçosos, os descontentes chocam-se contra as palavras, nelas não encontram nem doçura nem dureza, sofrem quando precisam escrevere, quando escrevem, fazem os outros sofrerem na leitura de textos pesados, vazios, que causam tédio.

 “O tédio... Quem tem Deuses nunca tem tédio. O tédio é a falta de uma mitologia. A quem não tem crenças, até a dúvida é impossível, até o cepticismo não tem força para desconfiar. Sim, o tédio é isso: a perda, pela alma, da sua capacidade de se iludir, a falta, no pensamento, da escada inexistente por onde ele sobe sólido à verdade” (Fernando Pessoa, Livro do Desassossego, p. 260).

 A redação técnica, embora contida, pode perfeitamente ser criativa; aliás, deve ser criativa. Nada mais desagradável que um texto longo, inchado de números e estatísticas, com palavras difíceis, sem o clarão de uma ironia, às vezes uma expressão afetiva, uma metáfora. É preciso saber alternar o peso da linguagem e dos conceitos abstratos com a leveza de uma palavra cordial ou de uma ideia evocativa e poética, o que enriquece o texto, tornando-o mais assimilável.

 O estudante de direito em geral se defronta com leituras áridas, de juristas às vezes excessivamente técnicos, que não se permitem a liberdade de escrever com o sentimento, porque vivem algemados à lógica e à razão. Em compensação, muitos autores escrevem com simplicidade e clareza, o que não impede que adotem as boas lições dos clássicos e saibam redigir com elegância e fino lavor literário. Cabe ao estudioso escolher o autor que mais de perto lhe fale à sensibilidade; uma vez feita a escolha certa, o estudo se torna muito mais proveitoso e interessante.

Escrever é criar: criar é um ato de amor. O bom estudante é sempre um estudioso; o bom profissional (advogado, magistrado, professor), dedica-se à leitura, à pesquisa e ao esforço de renovação de ideias e conceitos, o que se reflete na redação de textos, nos quais se descortinam novos pedaços de infinito.








TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Dignidade


Não grites, não suspires, não mates: escreve. 
Pensa na doçura das palavras. Pensa na dureza das palavras. 
Pensa no mundo das palavras. Que febre te comunicam. 
Que riqueza.
(Carlos Drummond de Andrade)
A boa redação é elegante. Escrever com elegância significa escrever com escolha, com gosto, com distinção (em latim, elegantia vem de eligere, eleger, escolher). A linguagem elegante é elevada, trata os temas com dignidade, usa palavras selecionadas. Na redação jurídica, acadêmica ou formal, não se deve empregar gíria, gracejos, modismos, lugares comuns; nesses casos, é preciso que o texto obedeça aos rigores da linguagem culta, sem exagero de preciosismos, mas sem o abuso da vulgaridade e do popular. Uma piada, uma “gracinha” mal colocada, às vezes uma simples vulgaridade baixa o nível da redação e faz o leitor perder a concentração; a partir daí, é difícil retomar o discurso e manter a atenção e o interesse pelo texto. Os modismos veiculados pela televisão (“super legal”, “hiper feliz”, “lindo de morrer”, “com certeza”) devem ser banidos: não fazem parte do nosso vocabulário.

Mas não é só. A redação elegante não ofende nem agride, trata os temas com elevação, evita o óbvio. Assim, em matéria jurídica, nunca se deve escrever “o facínora”, “o bandido”, “o malfeitor”, “o marginal”, mas apenas o que está no Código: o réu (eventualmente, o acusado). E para responder (contestar) uma ação, não é preciso ofender a parte contrária, assim como para apelar de uma sentença não é necessário criticar o juiz, afirmando que ele “errou”: deve-se argumentar com firmeza, expor os seus fundamentos, sem ofensa pessoal, sem agressão e sem pejorativos.

Mesmo os temas mais delicados (sobretudo eles) devem ser tratados com a máxima dignidade (sexo, partes do corpo humano, defeitos físicos, morais ou sociais) – com o emprego da linguagem mais simples e objetiva, sem insinuações, pejorativos ou preconceito.

Por fim, é necessário evitar o óbvio. Uma vez, um aluno escreveu: “A sociedade se compõe de homens e mulheres que lutam pela vida, nascem, crescem e morrem”. E outro: “Vigência significa que a lei deve estar em vigência”. Outro: “É preciso o nosso povo votar nas pessoas que são capazes de mudar ou pelo menos tentar mudar o retrato da realidade do Brasil, onde sobrevalece (?) miséria, fome, desemprego, educação, saúde etc”. Por fim, mais este: “Como podemos ver, o problema da violência é bastante genérico e está longe de ser resolvido”. Banalidades, considerações óbvias e inúteis, sem conteúdo, que nada dizem e nada significam.







TÉCNICA DE REDAÇÃO FORENSE - Conhecimento


Somos escravos de tudo que não sabemos; somos livres do que sabemos.
(sabedoria hindu)

Conhecer é “nascer com” (em latim, co+gnoscere), é gerar, produzir; ao contrário, ignorar (latim in+gnoscere) é não nascer, não gerar, abortar. Assim, “o conhecimento é um casamento, uma união do conhecido e do conhecente. O conhecimento é amor” (Souzenelle, Annick de, “O Simbolismo do Corpo Humano”, Ed. Pensamento, 1995, p. 18).

Na redação, é indispensável conhecer o tema sobre o qual vamos escrever. Se me derem agora uma página em branco, pedindo que escreva sobre a Polinésia, ou a Guerra da Secessão, é claro que não poderei fazê-lo, a menos que eu seja um gênio, ou um espertalhão intelectual, capaz de criar do nada. Posso escrever sobre esses e outros temas, desde que me seja dado algum tempo para pensar, reunir material, consultar livros e a Internet. Não é honesto, do ponto de vista intelectual, ir escrevendo a esmo, com desprezo dos fatos e das realidades, como se o leitor não merecesse respeito. 

Na verdade, para escrever bem, é necessário conhecer o assunto, pesquisá-lo, elaborar um esquema a ser desenvolvido e, só então, redigir o texto. A precipitação dos estudantes nas provas escolares é bem conhecida: diante de questões que ignoram, passam a “chutar” as respostas, ou ficam divagando, enrolando, escrevendo com letra bem miudinha ou difícil de ler, na tentativa de “enganar” o professor. Pode ser que esse “método” às vezes dê certo (a cola é a mais tradicional forma da esperteza estudantil), mas sabemos que tais experiências, ou demonstrações de imaturidade, não asseguram um futuro feliz: para saber escrever e ter o que escrever é preciso estudo, leitura, reflexão e prática de redigir.

Outro ponto: o redator precisa de versatilidade para substituir aquilo que ele ignora. Por exemplo: quando há dúvida sobre o emprego de uma palavra ou de uma expressão, o caminho mais curto e mais certo é mudar o texto, substituindo a palavra ou a expressão, por outra que o redator conheça melhor. Assim, se vou escrever “haja vista os exemplos citados”, mas fico em dúvida se está certa a expressão (no caso, está!), é melhor mudar para “em vista dos exemplos citados”. Não se perca tempo com a dúvida: é melhor substituir logo e seguir com a redação. Outro exemplo (infinito pessoal): “Fazia os alunos copiar as perguntas” (será melhor “fazia os alunos copiarem as perguntas”?) – escreva-se “fazia que os alunos copiassem as perguntas”. E assim por diante.

 É claro que, quando há tempo disponível, não custa buscar a solução da dúvida, recorrendo à gramática, ao dicionário etc. Mas em geral, é mais fácil e mais prático substituir palavras e expressões em dúvida, do que usá-las incorretamente, com prejuízo da boa redação.